domingo, 23 de março de 2008

Traduction de le vieil amant

Aqui minha primeira tradução do francês.

Emilie Simon, Le vieil amant (o velho amante)


Meu amor eu pensei
Com ingenuidade
Que um só ramo de lírios-do-campo
Poderia te trazer de volta
Agora encontrei
Um ou dois velhos sinos
Para te chamar de volta
Para te chamar de volta
Para mim, meu amor


Num belo dia
De Primaveras que eu deixei
Prados de teus pés caíram
Um só ramo de lírios do campo
Mas ele está seco
Esperando o beijo
Que não mais vem


O mês de Maio
Está no meu rosto
Esse ano
Eu tenho deixado as cores de muita efervescência
Às vezes o mês de Maio
É o meu desinteresse
Esse Ano
Eu tenho deixado as cores de muita efervescência

Às vezes

Às vezes...


Ele está partido, o tempo
Ele não tomou seus tempos
Eu que te espero
Como um velho pretendente
Eu que regresso
De frente à algumas migalhas
Um velho amante
Que não tem nem pé nem cabeça


Meu amor eu pensei
Com ingenuidade
Que um só ramo de lírios-do-campo
Poderia te trazer de volta
Agora encontrei
Um ou dois velhos sinos
Que tu não tinhas jamais amado

O mês de Maio
Está no meu rosto
Esse ano
Eu tenho deixado as cores de muita efervescência
Às vezes o mês de Maio
É o meu desinteresse
Esse Ano
Eu tenho deixado as cores de muita efervescência

Às vezes

Às vezes
...

Eu quero lhe confessar
Dançar face a face
Eu confesso, eu sonho
De te fazer revolutear
Respirar ar fresco
Observar, irradiar
O rosto de um amor
Que não tem visto o dia

Meu amor tenho pensado
Com ingenuidade
Que um só ramo de lírios-do-campo
Poderia te trazer de volta
Agora encontrei
Um ou dois velhos sinos
Eu sei que tu não amas os sinos
Eu sei

O mês de Maio
Está na minha face
Esse ano
Eu tenho deixado as cores de muita efervescência
Às vezes o mês de Maio
É o meu desinteresse
Esse Ano
Eu tenho deixado as cores de muita efervescência
Às vezes

Às vezes...

Pseudo- Independência

Lá fora, um jovem embriagado anunciando sua busca por independência. Temo que as coisas quando anunciadas tornem-se os clichês mais ridículos. Hoje considero a independência algo ridículo.

Na manhã do dia indizível acreditava piamente que a independência se manifestava em mim de modo incomensurável. Para mim independência era ouvir Aretha Franklin enquanto um ônibus inteiro era obrigado a satisfazer-se com os grunhidos da máquina de aço que os engolia e cuspia em seus determinados pontos.

Na minha ignorância de ser humano acreditava que independência era ganhar dinheiro suficiente para comprar um apartamento em um condomínio restrito e decorá-lo com vasos chineses.

E a independência independente de mim era um absurdo que eu negava ver como absurdo. Ela queria que eu descesse do ônibus no próximo ponto e voltasse para casa, assistisse a programação da tv á cabo e mudasse de canal a cada quinze segundos. A independência queria me levar para a casa dela e deita-la comigo em um colchão macio até a madrugada do dia seguinte.

No dia seguinte eu assistiria a aula.

Mas no dia seguinte e nos dias depois do dia seguinte se daria a mesma coisa e a mesma coisa e eu me consideraria o homem mais independente do mundo.

A independência queria que eu tivesse um quarto só para mim e que ligasse e desligasse o ventilador quando eu bem quisesse. E se o ventilador explodisse que eu pudesse aspirar as cinzas.

E a independência queria que eu pudesse escolher entre a minha vida e a vida dos outros sempre optando por uma vida que nem era minha nem era do outro.Era uma vida neutra que deixava que meu conceito de independência decidisse tudo. E a única coisa que eu decidia era a ideologia que eu seguiria. Na verdade nem isso.

Tudo era um conceito pré-formado de ideologias de outros e eu creditava a mim, por acreditar que era eu o fundador delas. Um conjunto de idéias pré-definidas por outros. Que ódio cometer plágio ideológico. Falta de leitura talvez. Talvez excesso. Talvez cegueira intelectual.

E a cegueira já havia corroído todos os sentidos, eu era seguidor de minha ideologia da independência e como um escravo queria obedecê-la anarquicamente através de uma série de regras que ela me impunha. E todos os ditames contrários eram regimes disciplinares absurdos e estúpidos e completamente ridículos. E eu não percebia que criava dentro de mim o regime mais disciplinar de todos. As leis de minha independência. E preso a essa premissa existencial dei sorte por conseguir corroer meu próprio sistema. Muita sorte. Deu-se numa tarde após o dia indizível. Quando tomei as últimas gotas da garrafa e saí à rua numa epifania escandalosa mostrando aos outros o resultado da minha ideologia independencialista.

E todos observaram de suas janelas, espantados e envergonhados, e apontavam, cochichando pausadamente ou comentando no seio da família:

Lá fora, um jovem embriagado anunciando sua busca por independência.

domingo, 2 de março de 2008

Palhaço

Sempre tive paixão por incendiar palhaços.

Na infância um deles tocou minha mão e me olhou com o rosto manchado: ele era todo fogo. E ardeu até as cinzas com a frieza do meu incêndio.

Incêndio frio como a resposta crua e sinceramente cortante de uma criança.

Quando éramos só nós, eu e você, eu ardia no seu fogo, agora tenho de incendiar aos outros para acender em mim uma centelha.

O palhaço é a centelha maior de minha satisfação.

E a satisfação é alcançada pelo cheiro do carvão puro.

Um dia minha amada me apresentou ao circo, e ele me devorou até o solstício de inverno, quando a chama se apagou por apenas um instante e o frio penetrou o negro dos meus olhos. E na escuridão da plenitude que é um olho recém descoberto vi a sombra do olho de um outro alguém. Um alguém que tirava do pó a cobertura de sua face e do sangue antigo a tintura de sua narinas. Naquele momento ele sorriu, debochado, destemido, o peito desabotoado. Sorria faceiro como um menino. Sorria ligeiro como as cegonhas grávidas de crianças imaginárias. Sorriu para ela.

E ela devolveu-lhe com um sorriso canhoto e aberto. Aérea.

Na descida do picadeiro vi os dentes de um palhaço que os meus olhos engoliram numa ânsia ruidosa de amor despedaçado.

Mas o amor serve aos olhos e os olhos ao amor e diante do desterro eu previ o flagelo.

Saiu da cauda do menor do flagelado vivo, e atacou a todos os flagelados do circo. Minha centelha se anunciava brutal.

E o palhaço não viu seu corpo arder. Pois o fogo que o consumia era azul e os olhos dos flagelado não podem ver o azul do fogo. Mas podiam sentir. E enquanto os olhos do palhaço rejubilavam na agonia do fogo minha amada derramou uma lágrima.

E dentro da lágrima dela o meu universo. Límpido, e nu.

Bastaria aquela lágrima para apagar o incêndio do palhaço.

Mas as lágrimas tem sal, e até que me provem o contrário, eu também posso incendiar o sal. Mas quando se carboniza o sal, a chama muda de cor e se torna laranja e vermelha. E os flagelados podem ver a chama vermelha. E viram.

O desespero é uma bola brincando com uma criança num pátio. O desespero é a bola quando a criança explode.

E no fogo trêmulo um elefante levantou as patas e balançou a cabeça suave como se estivesse querendo dizer algo necessário na sua língua de elefante. O elefante porém era mudo até em sua língua. E ao perceber isto tornou-se indiferente para com o incêndio do palhaço. Deu meio volta no próprio corpo e saiu pelos fundos. Na ponta dos pés como uma bailarina obesa de rum.

O século que demorou para que aquilo se consumisse, meu deus... O século que durou para que passasse a tormenta. O século que demorou para recolher os escombros! O século é apenas um século. Um segundo é a eternidade. E a eternidade é cada segundo sem os olhos dela.

Sempre tive paixão por incendiar palhaços.

Hoje incendeio a falta dos seus olhos.